Dicas

Como lidar com o mau humor dos adolescentes

 
«A culpa não é só das hormonas e os pais precisam de reagir», alerta especialista.

Tendo por base uma publicação do Grupo Lusíadas, verifica-se que, «os comportamentos reativos ou imprevisíveis da puberdade deixam muitas vezes os adultos completamente perdidos na gestão dos conflitos familiares».
 
Especialista em Medicina do Adolescente, o pediatra Sérgio Neves, do Hospital Lusíadas Amadora e da Clínica Lusíadas Almada, explica que a culpa não é só das hormonas e deixa alguns conselhos para os pais.
 
A puberdade chega em média dois anos mais cedo para as raparigas, começando aos 10-13 anos os primeiros conflitos. Aos 14-16 anos surge a fase mais turbulenta. As guerras de palavras ameaçam tornar-se uma constante e muitas vezes os adultos sentem ter deixado de compreender as reações dos filhos.
 
“Nesta fase, o humor do adolescente será talvez um dos sinais de mudança que os pais mais valorizam e que mais os inquieta”, reconhece o pediatra Sérgio Neves. É importante ter noção de que a adolescência implica mudanças físicas significativas.
 
“As hormonas sexuais influenciam o desenvolvimento do cérebro, modificando o comportamento do adolescente, nomeadamente ao nível do humor e da impulsividade, bem como os interesses e capacidades intelectuais do adolescente”, explica o clínico.
 
Os contextos familiar e social são igualmente determinantes, mas o especialista em Medicina do Adolescente apela à empatia dos pais para lidar com o chamado mau humor do adolescente. Ser adolescente é habitar um corpo que cresce a diferentes velocidades e, “para os jovens, pode também ser angustiante lidar com as mudanças da idade”, lembra.
 
Segundo a mesma publicação, o ponto de partida pode ser um mau desempenho escolar, ou a vontade de desafiar as regras e/ou normas da família. Ou ainda a não-aceitação dos amigos pelos pais e até o modo de vestir.
 
Certo é que o conflito geracional “se deve frequentemente a uma escalada de gritos e contrarrespostas em relação a comportamentos” dos mais novos e que é preciso saber evitar o agravar das situações, agindo por antecipação e com coerência. “Os adolescentes são particularmente sensíveis à inconsistência das regras, a não serem ouvidos, ou a um ‘não’ sem justificação”, alerta o pediatra Sérgio Neves.
 
Educar torna-se, nesta fase, quase sempre um quebra-cabeças para os pais. Muitas vezes, o que antes tinha um efeito positivo de repente parece ter deixado de resultar e vice-versa. “Será que sou demasiado autoritário? Ou, por outro lado, muito permissivo?”, interrogam-se, os pais.
 
Para o especialista, no entanto, a resposta é óbvia: nenhum dos métodos resulta. O melhor é mesmo optar por um meio-termo, recorrendo ao sempre tão elogiado bom senso e praticando aquilo a que chama um “método autoritativo”. Ou seja, uma educação baseada em:
 
Regras bem definidas (de preferência discutidas previamente com o adolescente);
 
Sanções conhecidas ao não cumprimento e com uma duração definida;
 
Adaptação das regras e limites à maturidade do adolescente (flexibilidade, equidade e justiça);
 
Sérgio Neves lembra ainda que:
 
As sanções não devem envolver atividades promotoras de saúde, como o desporto;
 
Há que promover a autorregulação do adolescente (para melhor lidar com a frustração);
 
Poderá ser benéfico chamar à negociação pessoas que sejam significativas ao adolescente (por exemplo, outro familiar, um treinador, um professor);
 
O diálogo deve ser tido depois do “episódio de conflito”; É importante promover e valorizar as qualidades e ganhos dos filhos.
 
A experiência de Sérgio Neves permitiu-lhe, ao longo dos anos, identificar quais as situações que os pais devem evitar, de modo a facilitar a relação com os filhos adolescentes. Os erros mais comuns são:
 
Exaltarem-se e perderem a calma;
 
Os pais sentirem que já não são exemplo ou importantes na vida dos seus filhos;
 
Os filhos serem vistos como um foco permanente de conflito;
 
Não serem capazes de reforçar os ganhos e aspetos positivos dos filhos;
 
Sentirem que estão sozinhos na educação dos seus filhos;
 
Fazerem comparações entre os filhos e os seus amigos e ou colegas;
 
Projetarem nos filhos as suas próprias vivências como adolescentes;
 
Não aceitarem a diferença (crenças, orientação sexual, opção religiosa…)
 
Neste sentido, o mesmo pediatra reforça que, «A capacidade de pensamento abstrato e insight sobre si próprio e os seus comportamentos só é conquistada em média aos 16 anos”.  Antes disso, o comportamento dos jovens acaba por ser muitas vezes “reativo e algo imprevisível, uma situação que os próprios têm alguma dificuldade em gerir”.
 
A “oscilação entre a proximidade da família e o desejo de independência” faz parte do processo de conquista de autonomia e identidade do adolescente e são por isso comportamentos expectáveis:
 
Isolamento no quarto;
 
Recusa em participar nas atividades em família;
 
Fuga a conversas em que o tema seja o próprio adolescente;
 
Evitar manifestações de afeto à frente de amigos, recusando o acompanhamento pelos pais à escola.
 
Apesar de se tratar de um processo normal e que requer muita paciência, diálogo, afeto e compreensão dos pais, Sérgio Neves alerta para alguns sinais que podem revelar que algo não está bem com o jovem:
 
A adolescência surge muitas vezes como justificação para todo o tipo de comportamentos, mas de facto nem tudo se deve à idade e há atitudes e comportamentos que indiciam problemas mais graves.
 
Em causa, pode estar “uma depressão ou perturbação de ansiedade (que pode ser secundária, motivada por exemplo por uma situação de bullying, não integração no grupo de pares, dificuldades escolares, conflitos familiares, orientação sexual ou desilusão amorosa), uma doença do comportamento alimentar, violência no namoro ou no contexto da família, ou ainda consumo de substâncias”.
 
É importante que os pais estejam atentos ao comportamento dos filhos “dentro e fora de casa”, até porque “conhecer os amigos dos filhos e estar a par dos seus interesses e rotinas favorece a proximidade, ajudando à prevenção” das doenças mentais, sublinha o mesmo pediatra, deixando estes pontos para análise:
 
Isolamento;
 
Conflituosidade e/ou agressividade;
 
Alteração do sono ou do padrão alimentar;
 
Mudança de amigos;
 
Abandono de atividades lúdicas e/ou desportivas antes praticadas com prazer.
 
Sérgio Neves afirma que “um pediatra com formação em Medicina da Adolescência consegue orientar a maioria das situações inerentes a este período”, mas lembra que, perante casos de maior complexidade, poderá ser necessário uma abordagem multidisciplinar que envolva a Psicologia, a Pedopsiquiatria e/ou outras especialidades.
 
Na mesma publicação da Lusíadas, Sérgio Neves alerta para a importância do sono e lembra que, durante a adolescência, “há modificações na secreção de hormonas como a melatonina ou cortisol, que interferem com o sono” e por isso os padrões de sono do jovem podem alterar-se ligeiramente.
 
No entanto, embora seja aconselhável despistar problemas de ansiedade ou depressão, Sérgio Neves explica que a maioria dos problemas de insónia ou dificuldade em adormecer referidos em consulta normalmente estão relacionados com a prática de exercício intenso a horas tardias, o consumo de bebidas estimulantes e/ou o uso de telemóveis, muitas vezes até na cama.
 
Não é demais lembrar que um adolescente deve dormir em média oito a 10 horas por noite e que o sono é fundamental para:
 
- O crescimento: a libertação de hormona de crescimento é feita sobretudo durante o sono;
 
Um bom desempenho académico: a privação de sono diminui a concentração e a memória, favorecendo o absentismo escolar no período da manhã;
 
Estabilidade do humor: a falta de sono provoca maior irritabilidade, menor tolerância e dificuldades na interação social, conclui o mesmo especialista.