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O que sofrem os filhos de pais que não se entendem

O que sofrem os filhos de pais que não se entendem
O que sofrem os filhos de pais que não se entendem  
Foto - Freepik
As crianças são testemunhas silenciosas num ambiente de maus-tratos físicos e psicológicos, cujos danos persistem pela vida fora.

Como se não bastassem as muitas feridas que as mulheres vítimas de maus-tratos carregam, a ponto de, em muitos casos, lhes ser ceifada a própria vida, as crianças também não conseguem sobreviver com a dignidade, o amor e o respeito que merecem. Crescer num ambiente tóxico desencadeia feridas profundas de tal ordem que os mais novos sentem-se responsáveis pela situação e sem saber o que fazer para sair dali ou para melhorá-la.
 
Segundo Susan Forward, “Qualquer comportamento destinado a controlar e subjugar outro ser humano recorrendo ao medo e humilhação, através de ataques físicos ou verbais, é abuso”, sendo que, uma criança que se desenvolve num cenário violento acaba por sofrer diversas consequências psicológicas e, em muitos casos, também físicas em virtude de os pais não se entenderem.
 
Como consequência, os mais novos não sabem o que é um apego saudável, afeto, compreensão, diálogo, empatia, amizade, solidariedade e, como se não bastasse, ainda crescem com uma visão deturpada da realidade, pois acreditam que é normal viver assim e que não existem alternativas pelo que, sentem que o seu futuro está irremediavelmente comprometido e, em muitos casos, é verdade.
 
Estas crianças desenvolvem-se sem saber em quem podem confiar e até contar, sentem-se inseguras, desprotegidas, sozinhas e em constante estado de alerta, sendo dominadas pelo medo. Também a sua capacidade de socialização fica comprometida e desconfiam de tudo e de todos, precisamente porque não puderam confiar nas suas principais referências que são os seus pais.
 
Para além de se sentirem mal, de chorarem muito, de criarem uma má imagem a seu respeito, estas crianças ainda vivem angustiadas com o sofrimento da mãe que, não conseguindo sair da situação, acaba por não consolar os filhos, por não os proteger devidamente, por não lhes oferecer um cuidado adequado, um lar estável e saudável, acabando por entrar muitas vezes em depressão.
 
Num ambiente destrutivo como este, os filhos também sofrem com problemas de identidade e regulação emocional, sentem-se culpados pela situação que vivem, e podem aparecer problemas de ansiedade, mesmo que não entendam o que sentem ou o porquê. Além disso, tentam evitar e reprimir essas emoções, o que faz com que as mesmas se tornem crónicas.
 
Os estudos levados a cabo demonstram também que, estas crianças apresentam problemas de autoestima, autoconfiança e na autoimagem, o que dá azo a problemas comportamentais com colegas ou outros adultos. Por norma, são recorrentes queixas na escola, na relação entre pares, indisciplina para com os professores e outros adultos, estendendo-se ao espaço público à medida em que crescem e entram na adolescência, mas também existem muitos casos de crianças e jovens que se isolam de tal modo que rejeitam participar em situações sociais, que desejam passar despercebidas e que até não saem de casa, apesar do muito medo que vivenciam no lar.
 
As crianças expostas a situações de abuso podem desenvolver o transtorno de stress pós-traumático que se resume a problemas de saúde (físicos e mentais), com memórias repetidas do que já viveram, pesadelos, flashbacks, dissociações ou desconforto ao recordar o que experimentaram. Registam-se também lacunas no que se refere à responsabilização perante os seus atos, aceitar uma tarefa sem medo, assumir um compromisso, revelam um recuo em habilidades que já tinha ou deveria ter adquirido, dificuldades em relacionar-se com outras pessoas, isolamento, retração, pouca expressão emocional e desinteresse pelas brincadeiras próprias da sua idade.
 
Os trabalhos de investigação também mostram que estas crianças sentem dificuldades em adormecer, apresentam uma agitação fora do comum, sentem-se inconsoláveis, mas não conseguem verbalizar essas emoções, apresentam hipervigilância, diminuição ou excesso de concentração, ou respostas de sobressalto.
 
Os profissionais na área da psicologia alertam para a importância de encaminhar estas crianças para uma terapia especializada, sob pena de estes problemas ganharem expressão e comprometerem o desenvolvimento dos mais novos dando lugar a problemas graves nas etapas de desenvolvimento que se seguem.