Durante as alegações finais, o procurador do MP disse considerar que Maurício Cavaco deve ser condenado por homicídio simples com atenuação especial, tendo em conta o regime especial para jovens, a ausência de antecedentes criminais, o facto de ter confessado o crime e de ter procurado tratamento psicológico.
O magistrado disse entender não ter ficado provado em sede de julgamento que o crime foi em legítima defesa, afastando também a possibilidade de o arguido ser inimputável, conforme sugeria a primeira perícia psiquiátrica, realizada um mês após o crime, tendo afirmado considerar a segunda perícia mais válida.
Após essa perícia, o especialista do Hospital de Faro diagnosticou ao acusado “stress pós-traumático, perturbação depressiva e perturbação de ansiedade”, a partir de “uma série” de instabilidades emocionais e afetivas.
Segundo o especialista, na altura do crime, a “situação de autodefesa” implicou “a diminuição da avaliação das consequências de uma agressão de tal calibre” e “a completa anulação da avaliação da ilicitude” do ato.
No entanto, o procurador do MP afirmou entender que o jovem era capaz de distinguir o que era certo do que era errado, tendo agido de “livre vontade” e de forma consciente e argumentou que houve “contradições” nas conclusões daquela perícia, cuja validade científica questionou.
O magistrado afastou, ainda, a possibilidade de se tratar de um homicídio privilegiado, sustentado pela Defesa e que, segundo o Código Penal, se verifica quando alguém mata “dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa”.
Afirmando que ficou provado que o jovem atuou num “quadro inequívoco” de violência, o procurador considerou, no entanto, que “não há sinais para considerar que [no momento do crime] Maurício tenha agido para defender a mãe de uma agressão iminente e violenta que lhe pudesse causar a morte”.
Opinião diferente tem a advogada de defesa, Elisabete Romão, que deixou duras críticas à forma como a Polícia Judiciária conduziu a investigação e, numa intervenção emotiva, questionou os jurados e a audiência sobre o que fariam numa situação semelhante, depois de anos sob um "comportamento humilhante diário" e a falta de afeto.
“É um ato tão desesperado que todos praticaríamos [o crime] naquelas circunstâncias”, defendeu, acrescentando considerar que a vítima conseguiu condenar o próprio filho duas vezes, fazendo tudo para “tornar uma criança boa num homicida”. A advogada lembrou que o jovem ainda hoje continua a falar do pai no presente e se sente perseguido por este, “tal é a perturbação” a que foi sujeito.
Segundo Elisabete Romão, o pai de Maurício “conseguiu manipular uma família”, ao ponto de, em tribunal, a mãe do jovem ter praticamente “desculpabilizado” o marido, mesmo depois de ter sido sujeita a comportamentos humilhantes e violentos durante vários anos e receber com frequência ameaças de morte.
“Para podermos saber se houve emoção violenta tínhamos de ouvir todos os dias ‘ele vai-me matar’, 'eu vou-me matar’, ‘ele vai-nos matar’. Enquanto não formos capazes de poder sentir estas palavras todos os dias […], só aí poderemos saber o que Maurício teria sentido naquele dia”, alegou.
O crime ocorreu em dezembro de 2023 na casa da família, na aldeia de Várzea do Vinagre, na freguesia de Santa Catarina da Fonte do Bispo, no distrito de Faro, quando o jovem, na altura com 19 anos, alegadamente interveio em defesa da mãe, matando o pai, de 63 anos.
A leitura do acórdão ao jovem, que está em prisão domiciliária na casa de uma tia, ficou marcada para o dia 14 de maio às 16:00, no Tribunal de Faro.
Lusa