O Sul de Portugal está a ser cada vez mais afetado pela seca e, se não chover este ano, o país vai-se debater com uma “crise da água”, sobretudo no Algarve e no Alentejo, afirmou o investigador Nuno Loureiro.
“Por um lado temos a crise na saúde, que enche os noticiários no dia-a-dia, é dramática e é uma crise de falta de planeamento. Temos a crise da habitação, que agora está um pouco menos falada porque estamos ocupados com o que se passa na Palestina e na Faixa de Gaza, e vamos ter a muito curto prazo a crise da água”, afirmou o investigador da Universidade do Algarve (UAlg).
Nuno Loureiro advertiu que, se este ano hidrológico não for “generoso”, no próximo ano, a crise da água “vai estoirar à força toda” e afetar especialmente os territórios Do Alentejo e Algarve.
“As reservas que temos já não nos garantem um ano [de consumo], ou garantem com muitas limitações. E perante esta situação não há respostas fáceis, não há soluções fáceis, mas há soluções que têm de ser adotadas e que passam por um planeamento e uma fiscalização séria”, defendeu.
A mesma fonte reconheceu que, entre as áreas de atuação para tornar o consumo de água mais sustentável, está o consumo doméstico e esse “gere-se pelo preço, não se gere com campanhas cor-de-rosa”, de publicidade.
O investigador, que conta com estudos na área dos recursos hídricos, disse que a gestão faz-se também com “coisas completamente impensáveis no Algarve atual”, como é, por exemplo, a “propagação de piscinas privadas”, que classificou como um “absurdo” num cenário de escassez de água.
“Toda a gente tem uma piscina, uma piscina é um volume de água considerável(…) É um consumo de água privado, é um desperdício de água privado, que não traz contrapartidas absolutamente nenhumas”, defendeu, frisando que se pode dizer que a “agricultura gasta muito ou gasta pouco, mas produz alimentos, produz emprego”.
Nuno Loureiro apelou para um maior planeamento e fiscalização, através da utilização de ferramentas como, por exemplo, as imagens de satélite, que mostram um “acréscimo das áreas regadas no Algarve ao longo do tempo”.
“Se for buscar imagens dos anos de 1980, vê-se como é pequena a mancha dos citrinos de Silves, vê-se como toda a zona a norte e a sul da [Estrada Nacional] 125 entre Tavira e Vila Real de Santo António é modesta. Nos anos recentes, se formos buscar imagens de 2018, 2020, 2022, vê-se que cada vez cresce mais e cada vez se rega mais”, acrescentou.
Esta ferramenta permite “fiscalizar criteriosamente a utilização da água” e não está a ser utilizada pelos decisores técnicos e políticos de forma adequada, mas “tem de começar a ser”, defendeu.
“Esta imagem de satélite permite, utilizando as diferentes bandas de imagem, caracterizar perfeitamente o estado hídrico da vegetação”, acrescentou o investigador.
Pode ver-se, por exemplo, se uma vegetação “muito satisfeita de água está a ser regada” e essa informação pode cruzar-se com “as possíveis fontes de água, entre as quais os furos ilegais” ou “as barragens que não podem regar, mas continuam a regar ou as culturas continuam a ter água”.
Nuno Loureiro considerou que estas ferramentas “têm de começar a ser utilizadas porque o assunto é muito sério” e, “mesmo que este inverno chova um bocadinho mais, pode atenuar um pouco a dor mas não é remédio” para o problema que a região se enfrenta.
Lusa