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Os pais que gostaríamos de ter e que não tivemos

O facto de colocarmos um filho no mundo, não é uma garantia de que somos bons pais.
O facto de colocarmos um filho no mundo, não é uma garantia de que somos bons pais.  
Foto Freepik
O facto de colocarmos um filho no mundo, não é uma garantia de que somos bons pais.

Ser pai ou mãe implica desejar ter um filho, estar preparado para respeitá-lo, para amá-lo e acarinhá-lo, no entanto, bem sabemos que, nem todos os adultos reúnem esses requisitos elementares para que consigam exercer a parentalidade de forma positiva.
 
Ao mesmo tempo, por muito que pensemos que, naturalmente os nossos filhos vão gostar de nós, mesmo que nem sempre sejam bem cuidados, não corresponde à verdade, pois, desde cedo que os mais pequenos sentem se são amados pelos pais, se recebem carinho, conforto, compreensão e se fazem parte de um núcleo familiar que os acolhe. É por essa razão que existem filhos descontentes, pais insatisfeitos e conflitos familiares: é porque a parentalidade é um processo simples e complexo ao mesmo tempo. É porque muitos pais não se preocupam muito com a sua função e a qualidade da mesma e também porque os filhos são exigentes e gostariam de receber aquilo que merecem.
 
São muitos os filhos que relatam em consulta de psicologia que gostariam de ter tido um pai mais presente e uma mãe carinhosa e compreensiva. Dizem também que sofrem pela ausência de afeto, de compreensão e de respeito pela sua diferença, acabando por mostrar muita dor face à educação que receberam e que, em muitos casos, ainda sentem na idade adulta.
 
Segundo os psicólogos, o facto de desejarmos ter outros pais ou simplesmente não conseguirmos aceitar a forma como fomos e somos tratados, dá lugar a uma ferida que nos persegue pela vida fora e que se reflete nas mais variadas situações.
 
«É um vazio que é acompanhado pela sensação quase persistente de que algo nos falta para que sejamos seres mais completos e melhores». Muitos filhos mantêm uma relação próxima com pais que nunca os valorizaram e respeitaram, mas «a ferida permanece lá, sempre à espera que a situação se altere e que se consigam encontrar os pais desejados, mas tal não acontece e o sofrimento persiste».
 
Os pais são imperfeitos, tal como os filhos o são. Há pais melhores e outros nem por isso, mas ninguém muda e não vale a pena estar à espera dessa alteração e reconhecimento. O importante é que aprendamos a aceitar esses pais tal como são e conviver com eles dentro do possível, mantendo uma postura de respeito mútuo, pois tal como os filhos não têm culpa de não terem o tratamento merecido e que todas as crianças deveriam receber, há pais que não conseguem mesmo fazer melhor devido às suas limitações que podem ser: a agressão física, verbal ou emocional, a exigência excessiva, o tipo de apego evitativo, a doença mental, a educação que também receberam dos seus pais e que não foi trabalhada, a crítica constante, a insatisfação perante a vida e a indisponibilidade para ter filhos.
 
Se a maioria das pessoas não se apercebe de que estes pais não conseguem dar amor, carinho e compreensão e, por isso, acabam por colher sempre aprovação social, os filhos sabem muito bem que aqueles adultos mais ou menos agressivos em termos físicos, acabam por esquecer-se de os valorizar, incentivar, motivar, amar e compreender, mesmo que, aos olhos dos outros isso não tenha importância ou significado.
 
De acordo com os especialistas, «existem pais que não amam os filhos e outros que dizem amá-los tanto que não lhes dão liberdade para serem como são e para se assumirem como seres humanos». Também há pais que desejam mal aos filhos e que estão sempre à espera que a vida “lhes mostre o que merecem para poderem aprender”, em vez de os ajudarem a serem melhores. Na posição dos técnicos, tal acontece porque:
 
- Esses pais não desejaram ter filhos e não sabem como cuidar deles. Não sentem amor, carinho ou compreensão porque simplesmente encaram aquele ser como “um intruso”, alguém que não deveria estar ali, sem se darem conta de que foram eles que os colocaram no mundo.
 
Outras vezes, podem ter problemas mentais ou simplesmente outros interesses em mente. Seja como for, poucas coisas são tão psicologicamente prejudiciais. Tanto é que estudos como o realizado na Universidade de Columbia indicam que esse tipo de experiências são vivenciadas pelo cérebro da mesma forma que a dor física.
 
Os pais narcisistas só veem o seu próprio interesse e não são capazes de oferecer amor aos filhos. Concentram-se naquilo que querem e até usam os filhos a seu belo prazer, não sendo capazes de perceber as necessidades dos mais novos e aquilo que poderiam melhorar na convivência diária. É um problema de saúde mental que constitui uma limitação e que leva a que muitos filhos não consigam conviver com eles e a gostar desses pais que também não lhes devolvem atenção.
 
Os pais controladores e autoritários não permitem que o filho seja, nem cresça, nem amadureça, nem escolha o rumo da própria vida.  Estes adultos deixam marcas profundas porque limitam os sonhos, e enchem a mente do filho de profundas inseguranças. Esse tipo de criação e educação também deixa uma marca profunda no desenvolvimento da pessoa.
 
Pais que preferem um filho ao outro também acabam por fazer com que o filho não entenda a razão pela qual não é merecedor de atenção, respeito, amor e carinho.
 
Perante estes pontos, são comuns as marcas da carência nos filhos que, sem saberem a razão, acabam por não conseguir ser aprovados, valorizados e aceites pelos pais. Ao longo do seu percurso, guardam uma  ferida que foi aberta na infância e que teima em não fechar, que teima em limitar-lhes os sonhos, a autoestima e a autoconfiança, dando lugar a pessoas tristes e amargas, pessoas que parecem estar sempre à procura de quem lhes preencha o vazio e que as faça acreditar que merecem um lugar no mundo. Carregam uma culpa enorme que é desenvolvida por essa ausência de amor e, muitas vezes, pelo que os pais lhes fazem ou dizem que parece encaixar-se na tese de que esses filhos é que são responsáveis e os culpados de os pais não gostarem deles.
 
O primeiro passo para superar esse dano, é a aceitação. É preciso aceitar tudo o que aconteceu. É preciso entender que já não podemos mudar o passado e que o importante é o presente, é construir uma vida significativa com alguém que nos ame, respeite, valorize e que, acima de tudo, não seja encarada como alguém que nos vai preencher o vazio. Construir uma vida positiva com uma boa rede de amigos, um cônjuge compreensivo e carinhoso, é o primeiro passo para que se transforme o passado.
 
De acordo com os psicólogos, «é essencial ir ao fundo da nossa dor, entender o que nos aconteceu e libertarmo-nos de culpas, pois não as temos. Ninguém é responsável pelo seu nascimento e ainda menos pelos pais que recebeu». Sabendo disso, aproveitamos as experiências, analisamos e refletimos sobre o nosso percurso e preparamo-nos para construir uma família com novos valores e noutros moldes, mesmo que isso implique distanciar-nos dos pais que não nos amaram, em prol do nosso prazer de viver. Uma psicoterapia irá permitir que vamos ao fundo de todas essas questões e que encontremos um novo rumo, que transformemos os pensamentos que nos perseguiram e que encontremos a paz interior e o bem-estar com quem amamos e que nos devolve esse sentimento.
 
Para ser um bom pai ou uma boa mãe, basta querer, requer sentir, ser tal como é e melhorar aquilo que se considera que não faz bem a uma criança. É assumir que se deseja ter um filho, dar-lhe amor, carinho e atenção, estabelecendo regras e limites, mas com uma boa comunicação, um espaço de entendimento e a construção diária de uma convivência saudável, sem agressões de qualquer espécie e com muito respeito, sabendo que se trata de uma relação para a vida e que se quer bonita e positiva.