Lidar com uma família tóxica é das tarefas mais complicadas que existem porque são pessoas manipuladoras, que desprezam os seus membros, que usam e abusam da chantagem e cuja forma de funcionamento se assemelha a uma seita.
A base destas famílias é fazerem de tudo para que os seus membros vivam relações de dependência, que sintam medo e que não se afastem, mas são cada vez mais os casos em que tal não se concretiza.
Segundo os entendidos em terapia familiar, basta que uma pessoa seja tóxica para que toda a dinâmica familiar seja afetada e, regra geral, esse elemento acaba por influenciar outros de forma a ter cúmplices e conseguir tornar o grupo cada vez maior. É por essa razão que se torna muito complexa a tarefa de mudar algo e, são muitas as situações em que o afastamento é a única solução. Um elemento fala mal de outro e de outro, mas quando está na sua presença faz de conta que está tudo bem, mas há sempre alguém que não consegue mentir e fingir e, mais cedo ou mais tarde, tudo se revela. Este passa a ser um comportamento frequente, mas destrutivo que fica cada vez mais enraizado e, quem não concorda ou não o consegue seguir, acaba por estar cada vez mais afastado do grupo, tal como acontece numa seita, explicam os entendidos.
Estes membros disfuncionais nunca assumem os seus comportamentos, muito menos os erros e, ainda menos, são capazes de pedir desculpa ou de mostrar arrependimento, pela simples razão de que são mesmo assim e nada os modifica. Estas pessoas entendem a família como “um palco de guerra”, onde elas têm de brilhar, mandar, controlar e criticar todos os que não praticam as suas orientações. É fácil que um membro da família, mesmo que seja um filho ou um cônjuge, fique de fora só por não fazer exatamente o que lhe é exigido, só porque estuda, só porque se interessa por algo diferente dos supostos “líderes”. Por oposição, é apoiado e aclamado o elemento que “segue à risca” e que cumpre o que o grupo sugere. É uma dinâmica tóxica e muito própria de quem não aceita o progresso, a opinião do outro, as características individuais e ainda menos é capaz de respeitar alguém, sublinham os especialistas.
É evidente que integrar um grupo destes, implica muito esforço, nenhum respeito por si mesmo e uma exclusividade de atenção que se dá aos demais elementos, o que, mais cedo ou mais tarde, acaba por afetar a qualidade de vida e a sanidade mental dos seus membros.
Para lidar com este tipo de dinâmica, é preciso aprender a proteger-se, a manter-se afastado e a respeitar a sua vontade, o que nem sempre permite um contacto muito próximo e, em muitos casos, nem se consegue estabelecer qualquer tipo de relação mesmo com pais, irmãos e daí por diante.
Os entendidos nesta matéria lembram que, para além de afetar a saúde mental, a convivência com uma família tóxica tem mostrado ser muito destrutiva em termos sociais e comportamentais, a ponto de, uma boa parte dos presidiários estudados ter crescido num ambiente disfuncional. Assim, listamos algumas estratégias que deve considerar para proteger-se dessa dinâmica destrutiva:
1. Tente analisar frontalmente o que se esconde atrás da sua família
Em muitos casos, as famílias tóxicas sofrem de problemas mentais, mas mascaram-nos com um estilo “forte” e “poderoso” e muito crítico dos outros. Com essa atitude, levam os seus membros a protegê-los, a adorá-los e a perderem o sentido crítico. Acabam por defender, imitar e aceitar tudo o que estes pais fazem e, o mais grave, crescem com esses comportamentos e sentem orgulho neles. Quem se quer libertar disso, tem de “sair” do grupo, vê-lo de fora, criticar o que está mal e construir uma alternativa, o que acontece, em muitos casos, na idade adulta.
É importante reter que, só quando a pessoa sai dessa dinâmica é que tem noção do que sofria e do quanto a sua família era disfuncional, pelo que, essa tomada de consciência é fundamental para que se tratem as feridas e para que não se imite tal exemplo errático.
2. Limite o contacto
Apesar de ser muito difícil, a primeira medida a tomar é limitar o contacto. Para isso, analise bem a realidade e pondere as situações em que quer ou não participar e aprenda a recusar os convites. Priorize o seu valor próprio, a sua autoestima e detete aquilo que mais o afeta na sua família originária. Para se proteger da influência desses membros, tente analisá-los de fora e compreender as manobras que utilizam para o manipular, pois só assim conseguirá manter-se à margem dessas ações nocivas.
Seja o leitor a decidir se quer ou não manter o contacto com essas pessoas e qual a melhor postura a adotar, mas registe que, não poderá estar muito presente, muito menos tolerar essas artes de manipulação e influência negativa e, aos poucos, verá que está cada vez mais distante dessa realidade.
3. Estabeleça uma margem física e emocional
Além de restringir o contacto com um ambiente familiar nocivo, convém executar outra decisão: estabelecer limites físicos e emocionais. Para isso, é preciso argumentar com clareza e assertividade; e ter em conta as seguintes recomendações dos especialistas:
• Exija que o respeitem em todos os momentos em que está presente;
• Mostre claramente que não permite tudo e diga o que não aceita;
• Diga que não está interessado em corresponder ao que lhe exigem e que as expectativas são de cada um, pelo que, o leitor não terá de corresponder ao que esperam de si;
• Deixe de se sentir culpado por dizer “não” e por impor os seus limites e respeito;
• Lembre-se que pessoas tóxicas vivem para invadir e superar os limites alheios. Diga aos seus pais que, se não o respeitarem e aceitarem tal como é, acabará por afastar-se definitivamente.
Para conseguir reunir forças para ser assim, é imperioso que tenha uma boa rede de apoio, como sendo, um parceiro/a, bons amigos e uma boa convivência com a sua família construída.
4. Não os enfrente, aplique a técnica da “pedra cinza”
Para lidar com uma família tóxica, entenda que é inútil enfrentá-la. Estas pessoas têm um nível muito baixo de autoconsciência e responsabilidade emocional. Nestes casos, é útil aplicar a técnica da «pedra cinzenta:
• Ignore as suas provocações;
• Opte por contactos breves e assertivos;
• Demonstre indiferença às suas demandas e vitimização.
• A interação com a família disfuncional deve ser neutra.
• Ao implementar a técnica da “pedra cinza”, é necessário um certo distanciamento emocional, bem como firmeza para manter as decisões tomadas.
5. Tenha uma rede de apoio próxima
Uma família é aquela que se constrói com relações saudáveis e com maturidade emocional, o que contrasta com um núcleo disfuncional. Assim, se a sua célula originária é tóxica, procure pessoas à altura de as substituir como sendo a pessoa que escolheu para dividir a sua vida, mantenha uma boa relação com os seus filhos e aproxime-se de pessoas com bons valores e sentimentos que, facilmente podem ser equiparados a uma família: àquela que o leitor escolheu. Esta é a base para que se entregue afetivamente e para que sinta amor, apoio e conforto, já que não recebeu esse suporte de quem o colocou no mundo.
Tente não se isolar ou deixar que aquela família tóxica seja o seu único cenário de socialização. Conheça e construa laços felizes com pessoas que valem a pena e que não o magoam e, aos poucos, vai sentir-se cada vez mais distante do grupo tóxico.
6. Pratique o desapego
O desapego é o processo inverso do vínculo, ou seja, aprender a libertar-se daquilo que o magoa e faz sofrer. Para tal, os especialistas recomendam:
• Deixe de esperar apoio ou validação da sua família;
• Entenda-se como responsável por si mesmo e que deverá procurar o seu bem-estar e as pessoas que, efetivamente lhe fazem bem;
• Deixe de se incomodar com o que os seus pais e demais familiares tóxicos dizem a seu respeito e aprenda a valorizar-se pelo que é e pelas suas conquistas com pessoas saudáveis, maduras e “boas”;
• Reformule a informação que recebeu da sua família. O exercício é longo e doloroso, mas é a única forma de tratar e curar essas feridas e de abrir portas para se tornar numa pessoa nova e melhor.
7. Pense no amanhã e no relacionamento que deseja ter com eles
Para lidar com uma família tóxica, é preciso esclarecer muito bem que tipo de relacionamento é possível estabelecer e aquilo que o leitor está disposto a dar e a receber.
Para facilitar a tarefa, registe estas linhas de orientação dos entendidos nesta matéria:
• Desligar-se completamente.
• Continuar da mesma forma.
• Estabelecer contatos específicos
8. Se precisar de estar com os seus pais, planeie o encontro
Pode ser muito difícil desassociar-se completamente de figuras próximas, porque elas são dependentes ou sabem como fazer com que o leitor não se afaste. Por isso, se tiver que se encontrar em determinados momentos com uma família tóxica ou disfuncional, é aconselhável planear estes aspetos:
• Quanto tempo vai durar o encontro?
• Diga quanto tempo vai ficar e ao que vai;
• Mostre exatamente o que não tolera e, caso ocorra a situação negativa, saia do local.
9. Peça apoio psicológico
É ponto assente que, os agressores não mudam assim com tanta facilidade e que, mesmo com uma terapia familiar, os resultados são pouco expressivos e duradouros, por isso, é tempo de cuidar de si mesmo. Recorra à ajuda de um profissional de psicologia que o orientará da forma mais adequada. Tenha sempre em mente que, a tarefa é muito complexa e que, sozinho, será muito mais doloroso, pois o leitor também precisa de desabafar e de receber dicas para aliviar esse sofrimento de anos. O psicólogo também o vai apoiar no sentido de construir uma boa autoestima para que melhor se possa proteger, além de que, quem cresceu num ambiente tóxico acumulou muita informação destrutiva e perturbadora para iniciar uma nova vida e construir um novo núcleo familiar. Assim, esse suporte torna-se fundamental porque o profissional vai dar-lhe compreensão e alternativas.
Por fim, registe que, as feridas provocadas por uma má dinâmica familiar são as mais dolorosas e difíceis de cicatrizar, sobretudo porque os pais são a primeira referência de um indivíduo e o primeiro contacto deste com o mundo. Quando se recebem valores e mensagens negativas e, em muitos casos, violência e frases destrutivas, é natural que a autoestima fique abalada, bem como a forma como se encara a vida, o mundo e as situações. Transformar essa forma de estar e de pensar é o desafio proposto pela psicologia e, para isso, é criado um programa de intervenção adequado e capaz de ajudar a aliviar a dor.
Apesar de uma família tóxica reunir muitos pontos negativos e prejudiciais, nem sempre é fácil que alguém consiga forças para se distanciar, no entanto, como já vimos, não restam alternativas: ou se resigna e aceitam os maus-tratos, ou temos mesmo de partir rumo à nossa felicidade e, não menos importante, no sentido de construir uma orientação positiva e com mais saúde física e mental.