A forma como gastamos o dinheiro revela muito a nosso respeito.
Se somos impulsivos, prudentes, responsáveis ou irresponsáveis, isso verifica-se na forma como aplicamos o nosso dinheiro. Ao mesmo tempo, os cientistas também analisam o que compramos para conseguirem compreender aquilo a que damos prioridade e que consideramos essencial para a nossa qualidade de vida.
Segundo o espanhol Joan Antoni Melé, que promove a ética nos bancos e a economia consciente, o extrato bancário permite fazer uma radiografia das motivações da pessoa e dos seus pontos fracos.
Nessa sequência, a economista Cristina Benito traçou cinco perfis psicológicos de acordo com a relação do sujeito com o dinheiro:
1. O piromaníaco é o tipo de pessoa cujo dinheiro “queima nas mãos” e que gasta de maneira compulsiva. Segundo a autora, por trás de um consumismo desenfreado, há muitas vezes uma grande insatisfação. Este tipo de pessoa, por norma, não está contente com o seu trabalho, com a família e com o seu estilo de vida em geral, pelo que tenta compensar essas carências comprando objetos para si mesma. Geralmente gasta mais do que pode, mas sente uma profunda necessidade de “premiar-se”, já que essa é a sua única satisfação: trabalha para poder adquirir tudo o que lhe apetece, pelo que não poupa, não pensa no futuro e ainda menos nos outros. Mal acaba de receber o dinheiro, já o está a gastar e, chega ao ponto de ainda nem o ter recebido e já o tem destinado.
2. O desprendido é uma variante altruísta do perfil anterior, mas, no seu extremo patológico, pode sofrer consequências igualmente nefastas. Este tipo de pessoa sente uma grande necessidade de entregar o seu dinheiro e o seu tempo – ambos estão associados – aos demais. Resulta em pessoas que querem estar sempre a pagar a conta num café, bar ou restaurante, que estão sempre prontas para um convívio com amigos em que eles arcam com as despesas e até para emprestar dinheiro aos outros, mesmo sem saberem se o mesmo será devolvido. São pessoas “tão generosas” que não pensam em si mesmas, pelo que acabam por passar por muitas dificuldades. De acordo com a mesma autora, estas pessoas possuem uma autoestima tão baixa que só se sentem bem a pagar tudo para que os outros lhes deem atenção e que gostem delas. É comum que acabem na miséria ou que trabalhem infinitamente sem que consigam juntar algum dinheiro ou bens materiais.
3. O neurótico com a pobreza é menos habitual, mas ocorre com frequência entre artistas e pessoas de índole idealista. Nelas está presente a crença de que é negativo enriquecer e que se deve manter um estilo de vida pobre. Quando têm sucesso na vida e ganham muito dinheiro, estas pessoas ficam profundamente infelizes e desiludidas consigo mesmas, pois não seria suposto que tal acontecesse e acreditam que enganaram os outros e que os prejudicaram de alguma forma. Este tipo de perfil enquadra-se na ideia de que é preciso ser pobre para ser puro, algo que está enraizado na cultura judaico-cristã. A Bíblia recorda-nos que “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”. O sujeito que tem essa neurose com a pobreza também pode ter medo de ser criticado, ou inclusive de perder afetos, se melhorar o seu nível de vida. Por isso, muitos profissionais competentes muitas vezes não se atrevem a pedir um aumento de salário ou a cobrar honorários mais altos para que a sua imagem fique sempre associada a uma pessoa “boa” e desinteressada.
4. A formiguinha é um perfil muito comum e, dentro da moderação, pode revelar uma relação saudável com o dinheiro. O problema é quando a pessoa vive num estado de carestia permanente, inclusive tendo uma renda mais que suficiente. A fixação doentia com a austeridade pode fazê-la passar dificuldades e privações injustificadas. Levada ao extremo, essa atitude pode apoiar-se no temor. Há um medo de que surjam gastos inesperados, de perder o trabalho, de uma catástrofe geral da qual ela só se poderá libertar graças às suas economias. Mas fazer tantas reservas pode tornar-nos incapazes de aproveitar os prazeres simples da vida, adverte a autora. Por norma, a formiguinha é uma pessoa poupada, que sabe gerir bem o seu dinheiro e, de forma mais equilibrada, consegue conciliar o prazer de ganhar com o de gastar.
5. A nuvem do não saber, o último perfil mencionado por Cristina Benito, diz respeito às pessoas que preferem que o outro lhes faça a gestão do seu dinheiro. Delegam essa responsabilidade ao companheiro, à família ou a um representante. A especialista alerta para o facto de que, essa despreocupação pode levar muitas pessoas à miséria, uma vez que, nem sempre estamos rodeados de gente de confiança. Há casos de parceiros que enganam o outro, sócios que levam a empresa à falência, gestores que arrecadam grandes quantias e daí por diante. Seja qual for a nossa relação com o dinheiro, tomar consciência sobre o que fazemos com ele, ensina-nos não apenas quem somos, o que temos de mudar, mas também como evitar vínculos tóxicos com os outros, tornando-nos responsáveis pela nossa vida, alerta a mesma economista.
Fátima Fernandes