Sociedade
Quando a carreira está acima do amor
É cada vez mais comum assistirmos a cenários de troca do amor pela carreira, a ponto de muitas mulheres optarem pela profissão e por uma carreira de sucesso e deixarem para trás a vida familiar.

 
Em número menor, há muitos homens que também abdicam da constituição da família  para se dedicarem a um sonho profissional. Sabendo que a felicidade humana requer evolução e não substituição, faz sentido refletir acerca desta nova realidade.
 
Não será possível conjugar amor com a carreira e o sucesso profissional?
 
Na posição de Alina Dizik da BBC Capital, “a tarefa não é fácil, uma vez que o mundo atual é exigente e requer muito tempo e entrega como bases para o sucesso, no entanto, é preciso encontrar o equilíbrio entre as partes para conquistar o todo.”
 
Um modelo que parecia estar a surtir efeitos positivos é o casal ter a mesma profissão. “Dessa forma, existe um maior entendimento, uma entrega conjunta ao mesmo objetivo e uma maior compreensão face ao tempo dedicado, no entanto, nem todos os casais ultrapassam facilmente a competição, o facto de um chegar mais facilmente a um determinado patamar ou ter uma oportunidade melhor.”
 
Quer isto dizer que, apesar de não existirem “fórmulas de sucesso”, é possível encontrar alguns pontos de equilíbrio, nomeadamente tentar colocar os sentimentos acima da carreira e deixar que os mesmos orientem a relação, pois caso contrário, em pouco tempo o amor vai transformar-se em amizade e, em menos tempo ainda, acaba por não sobreviver à ideia de um dos elementos do casal estar acima do outro.
 
Londa Schiebinger, professora da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e especialista em relações amorosas em especial no mundo académico acredita que, “homens e mulheres com a mesma carreira lutam pelo encontro da cumplicidade e por uma relação duradoura. Estes casais acreditam que a união pode trazer benefícios quer para o amor, quer para o trabalho.”
 
A mesma especialista realça ainda que, “tanto é possível construir uma relação duradoura e capaz de enfrentar os desafios do mundo profissional como facilmente se entrar na competição pelas mesmas oportunidades, pelo que, este cenário acarreta tantos prejuízos como benefícios.”
 
Se o trabalho em conjunto pode ser interessante e baseado na compreensão, já que ambos sentem as mesmas dificuldades, o empenho e o esforço, também a falta de tempo para manterem a chama acesa pode surgir como um constrangimento.”
 
Neste sentido, depreende-se que ter ou não ter a mesma profissão não é a base de um relacionamento saudável e duradouro, mas sim a importância que se dá ao relacionamento e à carreira. Noutras palavras, para que o amor “dê certo”, é essencial que o casal cultive esse sentimento diariamente, que seja capaz de colocar um “ponto final” no dia de trabalho para viver o romance e que exija de si mesmo esse tempo e disponibilidade.
 
A profissão é “o mal menor”, o importante e que as pessoas se amem e que queiram estar juntas no tempo que disponibilizam para alimentar os sentimentos.
 
São muitos os especialistas que acreditam que, quando o amor é forte, a competição no mundo profissional não abala o casal, mas quando é frágil, não é preciso esperar muito tempo para que a competição seja uma realidade.
 
Perante esta constatação, o segredo para manter uma relação à margem da carreira é mesmo entender que o amor precisa de ser protegido, alimentado e vivido diariamente. “Tem de haver tempo para conversar, para trocar ideias, para acrescentar o amor. Com este empenho diário, tudo se torna mais fácil, há mais motivação para trabalhar e para ascender profissionalmente.”
 
Londa Schiebinger defende que a sociedade começou a exigir mais dos seus funcionários e que, aos poucos o amor tem ficado para segundo plano, mas que este formato não conduz o ser humano ao sucesso, muito menos à felicidade.”
 
A mesma professora sublinha que, “os tempos mudaram, mas é preciso compreender o papel da família neste novo contexto. Ás vezes é preciso imaginar as coisas no plano inverso, pois como seria a nossa vida completamente isolados do mundo e sem amor?” De que nos serve uma carreira de sucesso, bons vencimentos se não temos com quem partilhar os nossos planos, os nossos tempos livres e se não nos preenchemos enquanto humanos?
 
“Muitas pessoas respondem que têm amigos e que não lhes falta companhia no pouco tempo livre que têm, mas será esse o modelo atual de felicidade? Conseguiremos imaginar a nossa vida uns anos mais tarde quando o trabalho já não assume a mesma relevância?”
 
Para Londa Schiebinger, a solução não é complicada, mas requer uma viagem no tempo. Antigamente a família estava no centro do ser humano. Mal nascíamos já estávamos predestinados para alguém. Era fácil aceitar o destino sem esforço e continuar aquilo que a família já tinha “decretado”. Tudo se “complicou” quando passamos a ter livre escolha e a não sabermos qual é o papel do amor e da família na nossa vida.”
 
O mundo profissional é cada vez mais exigente e leva-nos grande parte do nosso tempo, a ponto de nos ser mais fácil abdicar de alguém e de ter filhos do que encontrar um equilíbrio entre o nosso bem-estar e a profissão. Talvez andemos ao contrário neste mundo evoluído, pois o ideal é termos afeto e apoio dentro de casa e objetivos fora. Como se consegue isso? Apenas e só encontrando o papel do amor e da família nas nossas vidas!
 
Fátima Fernandes