Comportamentos

Meninas continuam a sentir-se “inferiores” aos meninos

 
O tema arrasta-se desde que há memória, mas é cada vez mais um imperativo inverter esta falta de autoconfiança feminina que começa desde a tenra idade.

 
De acordo com um estudo recente, há muito que se sabe que as meninas se colocam numa posição inferior no que se refere a talentos, inteligência e predisposição escolar, especificamente para a matemática, pelo que, o objetivo deste novo trabalho é compreender as causas para tal comportamento.
 
Os investigadores de uma universidade norte-americana colocaram-se em campo para tentar esclarecer a questão e, acima de tudo, apontar estratégias para reduzir essa discriminação. As conclusões do trabalho são claras, o problema começa em casa e prolonga-se na sociedade.
 
Os estereótipos começam muito cedo. Com seis anos, as meninas já se colocam numa posição inferior aos meninos, idade que pode determinar as escolhas e o percurso escolar.
 
O estudo publicado na revista Science, mostra que, logo a partir dos seis anos, as raparigas começam a ver-se a si próprias e às suas congéneres como menos talentosas, ou menos espertas, na sua linguagem mais simplificada, do que os rapazes. 
 
No mesmo artigo, os responsáveis pelo estudo, apontam a necessidade de implementar estratégias capazes de reduzir o preconceito.
 
Para Lin Bian e Andrei Cimpian é fundamental compreender a génese dos estereótipos generalizados que afetam as escolhas profissionais de homens e mulheres e que, sumariamente, têm a ver com a perceção e a auto-perceção de talentos.
 
Na posição dos investigadores, "O estereótipo de que os homens são melhores do que as mulheres em matemática prejudica o desempenho delas nesta área e impede que se interessem por matérias que implicam esse contacto com os números.”
 
Os investigadores testaram grupos de crianças de ambos os sexos, de cinco, de seis e de sete anos, sobre a sua perceção do talento de protagonistas de ambos os sexos em histórias que lhes eram contadas. As crianças tinham depois de escolher os que eram "really, really smart".
 
Aos cinco anos, tanto as meninas como os meninos escolhiam maioritariamente os protagonistas do seu próprio sexo. Mas, a partir dos seis anos, as meninas passavam a escolher com mais frequência os protagonistas do sexo oposto, enquanto os meninos mantinham a tendência de escolha pelo seu próprio género. 
 
De acordo com os especialistas, esta atitude deve-se à auto-perceção menos valorizada por parte das raparigas.
 
Se por um lado, a sociedade “as coloca” em áreas mais afastadas da matemática, por outro, os rapazes “por serem menos disciplinados e mais avessos à leitura”, acabam por ter de fazer escolhas distintas.
 
Os investigadores reforçam a importância de cortar com estes estereótipos que, começam desde cedo e que acabam por comprometer as escolhas e o sucesso profissional dos adultos.
 
Depois de analisados os resultados de todos os dados recolhidos, os investigadores asseguram que o desempenho escolar não é de forma alguma, um medidor de talentos, até porque, em muitos casos, as raparigas alcançam melhores notas do que eles, talvez pelo maior esforço que dedicam para contrariar a discriminação.
 
Para os autores, a conclusão é mais simples e profunda: as crianças assimilam precocemente a ideia generalizada de que a inteligência e o talento são qualidades do sexo masculino, e isso, acaba por minar a autoconfiança das meninas desde muito cedo.
 
Um estudo da OCDE de 2015, realizado embora com uma população escolar mais velha, já apontava conclusões nesta linha, mostrando que as raparigas têm maior probabilidade de ter dificuldades em matemática e ciências, mesmo nos casos em que são as melhores alunas.
 
Segundo os autores desse relatório da OCDE, isto explica-se por as raparigas terem em geral menos confiança do que os rapazes na sua capacidade de resolver problemas de matemática ou de ciência.
 
O novo estudo publicado na Science, demonstra a necessidade de contrariar esta tendência de fundo e, a importância de implementar estratégias de reforço da autoconfiança das meninas, em casa e na escola, como já apontava em 2015 o documento da OCDE. Mas há uma outra luta de fundo por fazer: a do combate ao preconceito que é, afinal, a primeira origem do problema.
 
Os especialistas não têm dúvidas de que, a educação ajuda a inverter esta tendência que, mais cedo ou mais tarde, também se vai refletir na escola e na sociedade em geral.
 
Na posição dos entendidos, se as meninas valorizarem os seus talentos, mais rapidamente enfrentam o preconceito através da sua negação e escolha de áreas que, supostamente não lhe eram reservadas.
 
Se as meninas acreditarem que têm as mesmas potencialidades para a matemática e ciências, naturalmente alcançam as suas oportunidades lado a lado com os rapazes e, “isso tem de começar em casa e prolongar-se nas etapas seguintes.”
 
Fátima Fernandes